sábado, 11 de dezembro de 2010

A arte e o consumo: Benjamin e Adorno.


Em 2010, a televisão brasileira completa 60 anos de existência. Nos meses de setembro e outubro foi comemorado esse aniversário em vários eventos, incluindo neles o Museu da América Latina em São Paulo.

Tendo em vista a importância desse fato e a possibilidade dele ser tema de redação dos vestibulares, apresento de maneira sucinta aos meus alunos as análises de Benjamin e Adorno (Escola de Frankfurt) sobre a Arte Tecnológica (ou técnica) na qual pode ser inserida a invenção e desenvolvimento da televisão. Penso ser útil lembrarmos das ricas contribuições desses ilustres pensadores acerca da Arte na Era das técnicas industriais de produção e difusão das imagens e dos sons.

De Walter Benjamin, se deve destacar reflexões sobre as técnicas de reprodução da obra de arte, particularmente do cinema, e as conseqüências sociais e políticas resultantes. De Adorno, o conceito de “indústria cultural” e a função da obra de arte no interior da sociedade de massas.

Benjamin, no ensaio “A Obra de Arte na Época de suas Técnicas de Reprodução” publica a primeira grande teoria materialista da arte. O ponto central da teoria de Benjamin está na análise das causas e conseqüências da destruição da “aura” nas obras de arte, enquanto objetos individualizados e únicos. Com o progresso das técnicas de reprodução, sobretudo da fotografia e do cinema, a aura, dissolvendo-se nas várias reproduções do original, destituiria a obra de arte de seu status de raridade. Para Benjamin, a partir do momento em que a obra fica excluída da atmosfera aristocrática e religiosa, que fazem dela uma coisa para poucos e um objeto de culto, a dissolução da aura atinge dimensões sociais e democráticas. Essas dimensões seriam resultantes das transformações técnicas da sociedade industrial que obrigatoriamente modificariam a percepção estética da população. A fotografia e a fonografia modificaram profundamente a maneira da população se relacionar com as imagens, sons, enfim, com a Arte. Segundo Benjamin, a perda da aura e as conseqüências sociais resultantes desse fato seriam particularmente sensíveis no cinema, no qual a reprodução de uma obra de arte carregaria consigo a possibilidade de uma radical mudança qualitativa na relação das massas com a Arte. O cinema que apresenta um popular (Carlitos) como seu objeto e não mais santos, reis e ricos burgueses.

Em suma, a análise de Benjamin mostra que as técnicas de reprodução das obras de arte, provocando a queda da aura, promovem a liquidação do elemento tradicional da herança cultural; mas, por outro lado, esse processo contém um germe positivo, na medida em que possibilita outro relacionamento das massas com a arte, dotando-as de um instrumento eficaz ( a Arte para as massas e pela as massas ) de renovação das estruturas sociais.

Essa postura otimista de Benjamin com relação ao cinema, foi objeto de reflexão crítica por parte de Adorno ao analisar a televisão e o rádio nos EUA. Adorno pensará a Arte tecnológica através do conceito de indústria cultural.

Adorno, em 1962, substituiu em seus escritos o conceito de cultura de massa pelo conceito de indústria cultural. O objetivo do filosofo foi o de esclarecer seus leitores sobre o engodo presente na idéia de uma cultura própria das massas, como se da população brotasse espontaneamente um conjunto de valores, idéias e estética. Para Adorno, que não concorda com essa interpretação, a indústria cultural (por meio da tv e do rádio), ao aspirar à integração da sociedade como sendo feita apenas de consumidores, não apenas adapta suas mercadorias ao consumo das massas, mas, em larga escala, determina como deve ser próprio consumo, isto é, produz também o consumidor, colocando-o no lugar do cidadão. Interessada nos homens apenas enquanto consumidores ou empregados, a indústria cultural reduz a sociedade, assim como cada um de seus elementos, às condições que representam seus interesses: vender produtos, realizando a mercadoria para milhões de consumidores, transformando a sociedade (feita de cidadãos) no simples mercado (feito apenas de consumidores).

Segundo Adorno, para realizar os objetivos descritos acima (sintetizados em uma verdadeira estratégia de dominação social), a indústria cultural ajuda a falsificar as relações entre os homens, bem como dos homens com a natureza, de tal forma que sua atitude frente a sociedade torna-se antiiluminista.

Considerando que o iluminismo tem como finalidade libertar os homens do medo, tornando-os senhores de si e do mundo, liberando o mundo da magia e do mito, e que ele admite que essa finalidade só possa ser atingida por meio da ciência e da tecnologia, as luzes da Razão instaurariam o poder do homem sobre a ciência e sobre a técnica e sobre o mundo.

Mas ao invés disso, livre do medo mágico, o homem tornou-se vítima de novo engodo: a dominação técnica. Essa dominação transformou-se em um poderoso instrumento utilizado pela indústria cultural para conter o desenvolvimento da consciência das massas. A indústria cultural impede a formação de indivíduos autônomos, independentes, capazes de julgar e de decidir conscientemente. Criando “necessidades” ao consumidor (que deve contentar-se com o que lhe é oferecido), a indústria cultural organiza-se para que ele não compreenda sua condição de mero consumidor, ou seja, que ele é apenas e tão-somente um objeto daquela indústria.

Portanto, o conceito de técnica de Benjamim seria problemático, pois conceberia a técnica (tecnologia) de maneira absoluta, esquecendo-se suas raízes históricas e de suas determinações sociais (expressas nas estratégias de dominação).

Ao visarem à produção em série e à homogeneização das “obras de arte”, as técnicas (tecnologias) de reprodução escondem as relações entre a entre o caráter da própria obra de arte industrial e do sistema social que a produziu. Portanto, se a técnica passa a exercer imenso poder sobre a sociedade, só foi possível devido às estratégias de dominação dos economicamente mais fortes sobre a própria sociedade. Para Adorno, a racionalidade da técnica identifica-se com a racionalidade do próprio domínio. Essas considerações evidenciariam que, não só o cinema, como também o rádio, não devem ser tomados como arte, pois seriam apenas técnicas de dominação da sociedade capitalista avançada, ou seja, não seriam mais que negócios. Nesse caso, seriam apenas ideologias. Enquanto negócios, seus fins comerciais são realizados por meio de sistemática e programada exploração de bens considerados culturais. Tal exploração Adorno chama de “indústria cultural” e a tv seria um dos mais importantes meios dela.

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