sábado, 24 de abril de 2010

Fragmentos do Positivismo


O filósofo e sua musa

Em 1844 Comte conheceu a mulher que iria transformar a sua vida e dar nova orientação ao seu pensamento. Chamava-se Clotilde de Vaux e era esposa de um homem que se encontrava preso por crime grave. Clotilde, no entanto, considerava seu casamento indissolúvel não deixando “ir muito longe” o relacionamento com o filósofo. Comte, apesar das restrições de Clotilde, se apaixonou por ela e a transformou na musa inspiradora de seus trabalhos dali por diante. Comte foi, sem dúvida, uma pessoa atormentada, angustiada e sofrida, sem jamais encontrar um apoio para seus sofrimentos pessoais, talvez por isso tenha se separado de Caroline sua ex-esposa. Porém, com 50 anos de idade, Comte encontrou em Clotilde alguém que lhe permitiu expressar seus sentimentos e necessidades emocionais. O filósofo ficou devedor, admirado e agradecido a jovem e, em longas conversas brilhantes com enorme erudição, estava sempre presente e implícito o desejo por Clotilde. Essa paixão levou a melhora do estado físico e mental de Comte, recém saído de uma grave crise psiquiátrica, porém levou a jovem moça se entristecer. Tomada por um enorme desejo pelo filósofo, desejo que não ousava confessar, viu seus sentimentos desmoronarem já que amava alguém que lhe era interdito. Clotilde faleceu um ano após ter conhecido Comte em uma severa crise depressiva e não é muito supor que a causa de sua morte tenha relação direta com a grande frustração amorosa com Comte. Clotilde foi transformada no gênio inspirador de uma nova religião apresentada em uma extensa obra da sociologia comteana intitulada de Sistema de Política Positiva ou Tratado Instituindo a Religião da Humanidade publicado em quatro volumes entre 1851 e 1854. Talvez o fato de Comte ter levado o rosto de Clotilde para ser o símbolo da "Humanidade" em sua na nova religião, possa ser encarado como forma de expiar-se por sua parcela de culpa na morte daquela jovem moça. Em todas as igrejas positivistas do mundo, no altar da Humanidade está representada a jovem Clotilde.

Comte e o projeto científico do século XIX

A euforia tecnológica propagada pela Revolução Industrial marcou o século XIX como um período de ascensão de diversas áreas do conhecimento. Os assuntos de ordem científica passaram a despertar o interesse de um grande público. Várias nações criaram instituições que buscavam o desenvolvimento de estudos em prol do progresso da ciência. Nesse mesmo período, o termo “cientista” foi cunhado. Nesse século são notórias as tentativas de sistematizar as diversas áreas do saber. Escolas politécnicas, museus, sociedades científicas e grandes gênios fizeram com que o “oitocentos” fosse contemplado pela euforia do saber técnico. A perspectiva de aplicação da ciência aos problemas da industria serviu de trampolim para estimular o financiamento público nessa área. Nesse contexto, é fundada em 1794 a primeira grande escola científica do mundo moderno, a École Polytechnique (instituição que formou Comte), para pôr os resultados da ciência ao serviço da França. Em diferentes graus e a diferentes velocidades outros governos começaram a financiar a ciência de uma forma mais direta através da criação de bolsas de estudo, fundação de instituições de investigação e conferindo honras e postos oficiais a eminentes cientistas. No final do século XIX o filósofo natural que prosseguia os seus estudos baseado em interesses particulares dá lugar ao cientista profissional com um carácter público.Nesse contexto As ciências exatas e naturais ganharam grande impulso na medida em que o desenvolvimento tecnológico vinculava-se com o desenvolvimento industrial. A Física, a Química fina e a Metalurgia foram as principais áreas de desenvolvimento científico. Influenciadas por essas mudanças, as ciências humanas também observaram o surgimento de novas áreas. Portanto, a obra de Comte deve ser entendida como fazendo parte dessa época de ouro da ciência moderna e de suas tentativas de sistematizar o conhecimento da humanidade através da idéia da uniformização de princípios metodológicos. Comte viveu os projetos, as realizações e os sonhos da ciência do século XIX.


A Literatura Gótica e a Religião da Humanidade

O século XIX foi realmente um período de grandes promessas. Porém, na Inglaterra Vitoriana a Revolução Industrial trouxe consigo o outro lado da moeda do desenvolvimento industrial: uma série de problemas sociais, dentre os quais uma super população que trabalhava em regime semi-escravo nas fábricas, onde velhos e crianças se transformavam em restos humanos. Depois do trabalho essas pessoas tinham a opção de se amontoarem nas vilas operárias, onde a marginalidade, a prostituição e a sífilis co-habitavam harmoniosamente. Bram Stoker (escritor irlandês) tenta analisar e solucionar os problemas sociais da época vitoriana criando um monstro – o conde Drácula, que se alimenta do sangue humano - que e se dirige para a Inglaterra onde existe uma super população alienada e sub-humana, pronta para ser devorada. O vampiro, na verdade, será uma espécie de peste necessária, a outra face dessa humanidade monstruosa.
A ciência no século XIX, quanto à questão da medicina e da física, “progride” a olhos vistos. A sangria do período das trevas já é considerada uma “heresia”. O corpo humano deixa de ser a última fronteira para exploração científica. Para as doenças são descobertas as curas e a longevidade humana deixa de ser desejo para se tornar um fato, o homem brinca de ser Deus. Eis que então Mary Shelley (escritora britânica) vem com seu monstro Frankenstein, pedaços humanos que tem vida através de uma mão humana que desafia o criador. Dr Victor Frankenstein é punido com o seu próprio crime. O desejo de se tornar o próprio Deus criador, se rebelando contra o mesmo, ao criar sua própria criatura, faz com que a sua condição de “filho rebelde” seja punido com a perda da família, do amor e, por fim, da sanidade. Essas obras da literatura gótica resumem as angústias do homem do século XIX, insatisfeito com o seu momento na história, expressando através da arte os seus medos e suas propostas de solução por meio do “fantástico”.
Auguste Comte em seu catecismo positivista propõe livrar (exorcizar) a sociedade do século XIX desses monstros, assombrações e do “fantástico”, chamados por ele de fetichismo teológico, propondo a consolidação do racionalismo e do cientificismo como solução de todos os conflitos da alma, da mente e da sociedade. Com um Deus, de certa forma ausente, as inquietudes humanas são analisadas pela literatura romântica num universo paralelo produzido pela mente, onde o “fantástico”utiliza-se do simbólico para se contrapor ao racional. Na Religião da Humanidade comteana, os santos cristãos e seus milagres são substituídos pelos cientistas e suas obras havendo o expurgo do fantástico. No catecismo positivista, a Humanidade está no lugar do Deus que agora é apenas uma entidade que faz parte do passado do progresso do Espírito Humano. Comte pode ser considerado, assim, um dos primeiros contrapontos a cultura gótica marcada por um descrédito geral em Deus, na religião e na Razão, típicos do século XIX.

AGUSTE COMTE E A ORIGEM DA SOCIOLOGIA


Isidore-Auguste Marie François-Xavier Comte, nasceu em Montpellier, no sul da França, a 19 de janeiro de 1798, filho de Rosalie e Louis-Auguste Comte. Com a idade de dezesseis anos, em 1814, Comte ingressou na Escola Poli¬técnica de Paris, fato que teria significativa influência na orientação posterior de seu pensamento. Em carta de 1842 a John Stuart Mill (1806-1873), Comte fala da Politécnica como a primeira comunidade verdadeiramente científica, que deveria servir como modelo de toda educação superior.

Comte, ao sair da Politécnica, já se mostrava sensível aos problemas socais e econômicos de Paris:

“A miséria pública é enorme em Paris; o pão é muito caro, e receia-se mesmo que venha a faltar. Não se pode dar um passo na rua sem ter o coração partido pelo aflitivo quadro da mendicidade; a cada instante encontram-se operários sem pão e sem trabalho, e com tudo iss, quanto luxo! Quanto luxo!”

Segundo Comte, apesar de a opinião pública ( o povo ) saber o que quer, isto é, indicando como objetivo da política o combate a miséria , caberia apenas aos especialistas em sociedade descobrir o meios e caminhos para alcançarem tal fim. Portanto, antes da ação política, seria necessária a constituição da Filosofia social teórica (a ciência das relações humanas coletivas) para se ter o caminho da renovação dos costumes, idéias e moral. Um dos princípios do pensamento Comteano era o seguinte: conhecer para agir; compreender para reorganizar. Portanto, com objetivos práticos nasce a Sociologia.

Um fator decisivo para formação da Sociologia de Comte foi o estudo do Esboço o de um Quadro Histórico dos Progressos do Espírito Humano, de Condor¬cet (1743 - 1794), ao qual se referiria, mais tarde, como "meu imediato predecessor". A obra de Condorcet traça um quadro do desenvolvimento da humanidade, no qual os descobrimentos e invenções da ciência e da tecnologia desempenham papel preponderante, fazendo o homem caminhar para uma era em que a organização social e política seriam pro¬duto das luzes da razão: Essa idéia tornar-se-ia um dos pontos fundamentais da filosofia de Comte.

Inicialmente, o pensamento de Comte se fundamentava em três teses: a) a possibilidade de poder a Política (Sociologia) vir a ser uma ciência positiva como qualquer outra; b) a indispensável divisão entre teoria (poder espiritual) e a prática (poder temporal); c) a confiança do povo nos cientistas, ou seja, nos sociólogos. A partir dessa teses, Comte iniciou seus trabalhos e reflexões para a constituição da ciência social.

Os três temas básicos da Filosofia Social de Auguste Comte.
O núcleo da Sociologia de Comte radica na idéia de que a sociedade só pode ser convenientemente reorganizada através de uma completa reforma intelectual do homem. Com isso, distingue-se de outros filósofos de sua época como Saint-Simon e Fourier, preocupados também com a reforma das instituições, mas que prescreviam modos mais diretos para efetivá-la. Enquanto esses pensadores pregavam a ação prática imediata, Comte achava que antes disso seria necessário fornecer aos homens novos hábitos de pensar de acordo com o esta¬do das ciências de seu tempo. Por essa razão, o sistema comteano estruturou-se em torno de três temas básicos. a) uma ciência da história com o objetivo de mostrar as razões pelas quais uma certa maneira de pensar (chamada por ele filosofia positiva ou pensamento positivo) e uma certa maneira de agir (chamada de por ele de sociedade industrial) devem imperar entre os homens; b) uma classificação das ciências; c) uma sociologia que, deter¬minando a estrutura e os processos de modificação da sociedade, permitisse a reforma prática das instituições para por fim à miséria social.
A Ciência da História: o progresso do espírito e da sociedade.
A filosofia da historia – primeiro tema da filosofia de Comte – pode ser sintetizada na sua célebre lei dos três estados: todas as ciências e o espírito humano como um todo se desenvolvem através de três fases distintas: a teológica, a metafísica e a positiva.

No estado teológico, pensa Comte, o número de observações dos fenômenos reduz-se a poucos casos e, por isso, a imaginação desempenha papel de primeiro plano. Diante da diversidade da natureza, o homem só consegue explicá-¬la mediante a crença na intervenção de seres pessoais e sobrenaturais. O mundo torna-se compreensível somente através das idéias de deuses e espíritos. Segundo Comte, a mentalidade teológica visa a um tipo de compreensão absoluta; o homem, nesse estágio de desenvolvi¬mento, acredita ter posse absoluta do conhecimento.

Paralelamente às funções de explicação da natureza, a mentalidade teológica desempenharia também relevante papel de coesão social, fundamentando a vida social. Confiando em poderes imutáveis, fundados na autoridade, essa mentalidade teria como forma política correspondente a monarquia aliada ao militarismo (feudalismo).

O estado teológico, para Comte, apresenta-se dividido em três períodos sucessivos: o fetichismo, o politeísmo e o monoteísmo. No fetichismo, uma vida espiritual, semelhante à do homem, é atribuída aos seres naturais. O politeísmo esvazia os seres naturais de suas vidas anímicas - tal como concebidos no estágio anterior - e atribui a animação desses seres não a si mesmos, mas a outros seres, invisíveis e habitantes de um mundo superior. No monoteísmo, a distância entre os seres e seus princípios explicativos aumenta ainda mais; o homem, nesse estágio, reúne todas as divindades em uma só.

A fase teológica monoteísta representaria, no desenvolvimento do espírito humano, uma etapa de transição para o estado metafísico. Este, inicialmente, concebe “forças” para explicar ficar os diferentes grupos de fenômenos, em substituição às divindades da fase teológica. Fala-se então de uma “força física”, uma “força química”, uma “força vital”. Num segundo período, a mentalidade metafísica reuniria todas essas forças numa só, a chamada “natureza”, unidade que equivaleria ao deus único do monoteísmo.

O estado metafísico tem, segundo Comte, outros pontos de contato com o teológico. Ambos tendem à procura de soluções absolutas para os problemas do homem; a metafísica, tanto quanto a teologia, procura explicar a “natureza íntima” das coisas, sua origem e destino últimos, bem como a maneira pela qual são produzidas. A diferença reside no fato de a metafísica colocar o abstrato no lugar do concreto e a argumentação no lugar da imaginação. Nessa perspectiva comteana, o estado metafísico se caracterizaria fundamentalmente pela dissolução do teológico. A argumentação, penetrando nos domínios das idéias teológicas, traria à luz suas contradições inerentes e substituiria a vontade divina por "idéias" ou "forças". Com isso, a metafísica destruiria a idéia teológica de subordinação da natureza e do homem ao sobrenatural. Na esfera política, o espírito metafísico corresponderia a uma substituição dos reis pelos juristas; supondo-se a sociedade como originária de um contrato, tende-se a basear o Estado na soberania do povo.


O pensamento positivo e a sociedade industrial.

O estado positivo caracteriza-se, segundo Comte, pela subordinação da imaginação e da argumentação à observação. Cada proposição enunciada de maneira positiva deve corresponder a um fato, seja particular, seja universal. Isso não significa, porém, que Comte defenda um empirismo puro, ou seja, a redução de todo conhecimento à apreensão exclusiva de fatos isolados. A visão positiva dos fatos abandona a considera¬cão das causas dos fenômenos (procedimento teológico ou metafísico) e torna-se pesquisa de suas leis, entendidas como relações constantes entre fenômenos observáveis. Quando procura conhecer fenômenos psicológicos, o espírito positivo deve visar às relações imutáveis presentes neles - como quando trata de fenômenos físicos, como o movimento ou a massa; só assim conseguiria realmente explicá-los. Segundo Comte, a procura de leis imutáveis ocorreu pela primeira vez na história quando os antros gregos criaram a astronomia matemática. Na época moderna, o mesmo procedimento invento reaparece em Bacon (1561 - 1626), Galileu (1564 - 1642) e René Descartes (1596 - 1650), os fundadores da filosofia positiva, para Comte.

A filosofia positiva, ao contrário dos estados teológico e metafísico, considera impossível a redução dos fenômenos naturais a um só princípio (Deus, natureza ou outra experiência equivalente). Segundo Comte, a experiência nunca mostra mais do que uma limitada interconexão entre determinados fenômenos. Cada ciência ocupa-se apenas com certo grupo de fenômenos, irredutíveis uns aos outros. A unidade que o conhecimento pode alcançar seria, assim, inteiramente subjetiva, radicando no fato de empregar-se um mesmo método, seja qual for o campo em questão: uma idêntica metodologia produz convergência e homogeneidade de teorias. Para Comte o método positivo se baseia na observação, na experimentação, na comparação, na classificação e na filiação histórica, constituindo os instrumentos para a obtenção e ordenação dos dados reais, que, reunidos em hipóteses de trabalho, acabam por se constituir na ciência propriamente dita.

Essa unidade do conhecimento não é apenas individual, mas também coletiva; isso faz da filosofia positiva o funda¬mento intelectual da fraternidade entre os homens, possibilitando a vida prática em comum. O conhecimento positivo caracteriza-se pela previsibilidade: “ver para prever” é o lema da ciência positiva. A previsibilidade científica permite o desenvolvi¬mento da técnica e, assim, o estado positivo corresponde à indústria, no sentido de exploração da natureza pelo homem.

Em suma, o espírito positivo, segundo Comte, instaura as ciências como investigação do real, do certo e indubitável, do precisamente determinado e do útil. Nos domínios do social e do político, o estágio positivo do espírito humano marcaria a passagem do poder espiritual para as mãos dos sábios e cientistas e do poder material para o controle dos industriais. O desejo de comandar transforma-se gradativamente no desejo de fazer a natureza à vontade, isto é, atuar sobre a natureza. A sociedade positiva industrial produz, portanto, relações sociais mais pacíficas do que as produzidas no estado teológico e metafísico. No passado da humanidade, o povo era dominado e estava sob comando; na fase industrial, é orientado, está sob direção; naquele súdito, nesse societário.

A Classificação das Ciências: do simples ao complexo.

A classificação das ciências – segundo tema básico da filosofia comteana – vincula-se à ciência da história. Ao traçar o mapa do desenvolvimento histórico do espírito, em sua caminhada para a apreensão da realidade, Comte mostra que a evolução de cada ciência obedece à periodização dos três estados, mas que essa periodização não se faz ao mesmo tempo em todos os domínios: o estado metafísico de uma ciência como a física, por exemplo, não é contemporâneo do estado metafísico da biologia. Segundo Comte, as ciências classificam-se de acordo com a maior ou menor simplicidade de seus objetos respectivos. A complexidade crescente permite estabelecer a seqüência: matemáticas, astronomia, física, química, biologia e sociologia. As matemáticas possuem o maior grau de generalidade e estudam a realidade mais simples e indeterminada. A astronomia acrescenta a força ao puramente quantitativo, estudando as massas dotadas de forças de atração. A física soma a qualidade ao quantitativo e às forças, ocupando-se do calor, da luz, etc., que seriam forças qualitativa¬mente diferentes. A química trata de matérias qualitativamente distintas. A biologia ocupa-se dos fenômenos vitais, nos quais a matéria bruta é enriquecida pela organização. Finalmente, a sociologia estuda a sociedade, onde os seres vivos se unem por laços independentes de seus organismos. A sociologia é vista por Comte como “o fim essencial de toda a filosofia positiva”. Matemática, astronomia, física, química e biologia atingem o estado positivo antes da sociologia, mas, permanecendo adstritas a parcelas do real, não conseguem instaurar a filosofia positiva em sua plenitude. A totalização do saber somente poderia ser alcançada através da sociologia.

A sociologia é entendida por Comte no mais amplo sentido da palavra, incluindo uma parte essencial da psicologia, toda a economia política, a ética e a filosofia da história. Da mesma forma como protesta contra a abordagem dos fenômenos psicológicos individuais in¬dependentemente do desenvolvimento mental da raça, Comte opõe-se também ao isolamento da política e da ética em relação à teoria geral da sociedade. Comte ressaltou ainda que os objetos das ciências sociais não devem ser trata¬dos independentemente do curso de desenvolvimento revelado pela história.

Aspecto fundamental da sociologia comteana é a distinção entre a estática e a dinâmica sociais. A primeira estudaria as condições constantes da sociedade; a segunda investigaria as leis de seu progressivo desenvolvimento. A idéia fundamental da estática é a ordem; a da dinâmica, o progresso. Para Comte, a dinâmica social subordina-se à estática, pois o progresso provém da ordem e aperfeiçoa os elementos permanentes de qualquer sociedade: religião, família, propriedade, divisão do trabalho, linguagem, acordo entre poder espiritual e temporal, etc.

Sociologia aplicada à Política.

A reforma das instituições para a extinção da violência e da miséria sociais – terceiro tema básico da filosofia de Comte – tem seus fundamentos teóricos na sociologia que ele concebeu. A sociologia conduzi¬ria à política, cumprindo-se, assim, o desígnio que Comte sempre se propôs de fazer da filosofia positivista um instrumento para a reforma intelectual do homem e, através desta, a reorganização de toda a sociedade. No seu modo de ver, a Revolução Francesa destruiu as instituições sociais do homem europeu impunha-se, conseqüentemente, estabelecer uma nova ordem. A Revolução fora necessária pensava Comte, porque as antigas instituições sociais e políticas eram ainda teológicas, não correspondendo, portanto, ao estado de desenvolvimento das ciências da época. A Revolução não ofereceu, porém, fundamentos para a reorganização da sociedade, por ter sido negativa e metafísica em seus pressupostos. A tarefa a ser cumprida deveria, portanto, ser a instauração do espírito positivo - na organização das estruturas sociais e políticas. Para isso, seria necessária uma nova elite científico-industrial, capaz de formular os fundamentos positivos da sociedade é desenvolver as atividades técnicas cor¬respondentes a cada uma das ciências, tornando-as bem comum.

Com relação ao principal problema social de sua época – o crescimento do proletariado industrial e a sua miséria –, a posição de Comte não foi uma posição revolucionária como a de Marx (1818 – 1883). Comte considerava que todas as medidas sociais deveriam ser julgadas em termos de seus efeitos sobre a classe mais numerosa e mais pobre. Acreditava também que os proletários (e as mulheres) pudessem abrandar o egoísmo dos capitalistas e que uma ordem moral humanitária poderia abolir todos os conflitos de classe. Os capitalistas deveriam ser moralizados e não eliminados: a propriedade privada deveria ser mantida. Comte foi, na verdade, um conservador e características dessa atitude são os seus elogios à ordem católica e feudal da Idade Média. Dentro de uma linha de revalorização do catolicismo, típica de sua época, atacou o protestantismo, considerando-o uma religião negativa e anárquica intelectualmente.

Para a Sociologia de Comte, 6 (seis) instituições sempre seriam necessárias para fazer com que o altruísmo predomine sobre o egoísmo (condição de toda a vida social). A propriedade (que permite ao homem produzir mais do que para as suas necessidades egoístas imediatas, isto é, fazer provisões, acumular um capital que será útil a todos), a família (educadora insubstituível para o sentimento de solidariedade e respeito às tradições), a linguagem (que permite a comunicação entre os indivíduos e, sob a forma de escrita, a constituição de um capital intelectual, exatamente como a propriedade cria um capital material) a divisão do trabalho (que com a especialidade das diversas funções realizadas por distintas pessoas, leva a necessidade do outro e a cooperação social), o governo ( a presença da autoridade como fundamento da organização social) e a religião ( niveladora de todos os pensamentos humanos por meio de um ideal de sagrado e profano).

Os anseios de reforma intelectual e social de Comte, contudo, não se limitaram a uma política e se desenvolveram no sentido da formulação de uma religião da humanidade. Isso aconteceu nos últimos quinze anos de sua vida, quando estabeleceu os princípios fundamentais dessa nova religião. Formulou então um novo calendário, cujos meses receberam nomes de grandes figuras da história do pensamento, como Descartes; o calendário tinha também seus dias santos, nos quais se deveriam comemorar as abras de Dante, Shakespeare, Adam Smith, Xavier de Maistre e outros. Comte redigiu ainda um novo catecismo, cuja idéia central reside na substituição do Deus cristão pela Humanidade.
O positivismo no Brasil
O positivismo de Auguste Comte exerceu larga influência nos mais variados círculos. Enquanto doutrina sobre o conhecimento e sobre a natureza do pensamento científico, incorporou-se a outras correntes análogas, que procuraram valorizar as ciências naturais e suas aplicações práticas. Junto a essas outras correntes, o positivismo constitui um dos traços característicos do pensa¬mento que se desenvolveu na Europa durante o século XIX.

Solo fértil foi encontrado pelo positivismo comteano, incluindo-se a religião positivista, em países de menor tradição cultural e carentes de ideologia para seus anseios de desenvolvimento. Esse fenômeno ocorreu na. América do Sul, sobretudo no Brasil.

As primeiras manifestações do positivismo no Brasil datam de 1850, quando Manuel Joaquim Pereira de Sá apresentou tese de doutoramento em ciências físicas e naturais, na Escola Militar do Rio de Janeiro. A esse trabalho viriam juntar-se a tese de Joaquim Pedro Manso Sayão sobre corpos flutuantes e a de Manuel Pinto Peixoto sobre os princípios do cálculo diferencial. Em todos encontram-se inspirações da filosofia comteana.

Passo mais importante, contudo, foi dado por Luís Pereira Barreto (1840 - 1923), com a obra As Três Filosofias, na qual a filosofia positivista era apontada como capaz de substituir vantajosamente a tutela intelectual exercida no país pela Igreja Católica. Pereira Barreto não foi um positivista ortodoxo, como Miguel Lemos (1854 - 1917) e Raimundo Teixeira Mendes (1855 - 1927), que se iniciaram no positivismo através da, matemática e das ciências exatas, quando estudantes na Escola Politécnica. Os dois entreviram na ciência fundada por Auguste Comte as bases de uma política racional e pressentiram, na sua coordenação filosófica, o congraçamento definitivo da ordem e do progresso, como dirá mais tarde o próprio Miguel Lemos.

Em 1876 fundou-se a primeira sociedade positivista do Brasil, tendo a frente Teixeira Mendes, Miguel Lemos e Benjamin Constant (1836 - 1891). No ano seguinte, os dois primeiros viajaram para Paris, onde conheceram Émile Littré e Pierre Laffite. Miguel Lemos decepcionou-se com “o vazio do littreísmo” e tornou-se adepto fervoroso da religião da humanidade, dirigida ida por Laffite. De volta ao Brasil Fundou a Sociedade Positivista do Rio de Janeiro, que constitui a origem do Apostolado Positivista do Brasil e da Igreja Positivista do Brasil, cuja finalidade era “for¬mar crentes e modificar a opinião por meio de intervenções oportunas nos negócios públicos”.

Entre essas intervenções, sem dúvida, foi importante a participação dos positivistas no movimento republicano, embora seja um exagero dizer-se que foram eles que proclamaram a República, em 1889. Influíram, é verdade, na Constituição de 1891 e a bandeira brasileira passou a ostentar o lema comteano “Ordem e Progresso”. No século XX, o entusiasmo pelo positivismo religioso decresceu consideravelmente, mas continuou a existir a Igreja Positivista do Brasil, no Rio de Janeiro, que permanece atuante ate os dias de hoje.

Segundo alguns estudiosos do pensamento social brasileiro, a influência do pensamento comteano foi ainda mais longe em nossa cultura, fazendo parte até da elaboração do conceito do Estado Novo varguista nas décadas de 30 e 40, fundamentado em ideais dos antigos partidos políticos republicanos gaúchos, instituições nas quais o positivismo também criou raízes durante o início do século XX.

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Durkheim e as relações da sociedade com o individuo


Considerado um dos pais da sociologia moderna, David Èmile Durkheim fundou a escola de sociologia francesa que, com seus inúmeros adeptos, influenciou decisivamente a história dessa ciência até meados do século XX.
Apesar de ter sido considerado um clássico das ciências sociais, referência teórica respeitada em todo o mundo, Durkheim sempre trabalhou engatado em sua época e preocupado com os problemas de seu país.
A exemplo de Comte, produziu um conjunto de conceitos e teorias explicativas da sociedade com o intuito de participar dos grandes acontecimentos de seu tempo e interferir na realidade que estava em sua frente, apresentando soluções científicas para os problemas sociais. Suas aulas na universidade sempre foram pautadas por temas oriundos da sociedade e da economia francesas do século XIX. Ministrando aulas sobre a Educação e a divisão do trabalho social, ou publicando textos dobre o suicídio e as formas elementares da vida religiosa, Durkheim sempre pretendeu associar a sociologia (o conhecimento científico) as propostas de entendimento e solução dos problemas da sociedade industrial em consolidação.
Durkheim nasceu na cidade de Épinal, situada na região de Lorena no nordeste da França, em 15 de abril de 1858. Viveu numa família muito religiosa na qual seu pai era um rabino. Não seguiu o caminho da família, optando por uma vida secular. Desde jovem, foi um opositor da educação religiosa, defendendo o método científico como única forma de desenvolvimento do conhecimento. Talvez como resquício desse momento de inconformismo religioso, em boa parte dos seus trabalhos, Durkheim procurou demonstrar que os fenômenos religiosos tinham origem em acontecimentos sociais.
Em 1879, aos 21 anos de idade, Durkheim foi estudar na Escola Normal Superior em Paris (École Normale Supérieure) e passou a dedicar-se ao mundo intelectual, formando-se em Filosofia no ano de 1882. Na faculdade conheceu as obras de Auguste Comte e de Herbert Spencer que se tornariam referências permanentes em sua formação científica e em seu estudo dos fenômenos sociais. Cinco anos após sua formatura, foi trabalhar na Universidade de Bordéus como professor de pedagogia e ciência social. Neste período, começaram seus estudos sobre sociologia.
Ainda em sua juventude, Durkheim presenciou alguns fatos marcantes que certamente refletiram nos fundamentos de seu trabalho intelectual. Em 1º de setembro de 1870, a França é derrotada em Sedan e logo depois capitula diante das tropas alemãs de uma maneira traumática para sua população. Como elemento do acordo de paz entre essas duas nações, os franceses derrotados perderam parte da Lorena (medida que transformou a cidade natal de Durkheim em uma terra fronteiriça no conflito franco-alemão). Nesse momento foi proclamada a III República que ficou com a responsabilidade de administrar as dívidas humilhantes oriundas a derrota e reorganizar o Estado em meio a um imenso “vazio moral” e a crescente descrença dos franceses em seu governantes. Ainda como responsabilidade do novo governo francês, foi pacificada a revolta popular da Comuna de Paris levando a morte vários trabalhadores e cidadãos franceses na capital. Esse contexto foi lido pelos franceses (e não só por eles) com um momento de grave crise moral, tornando a moralidade alvo de investigações filosóficas e religiosas. Durkheim deu a sua contribuição científica para esse debate, explicando a origem da moralidade nos fatos sociais, na sua coerção e em suas funções para a sociedade.
A III República trouxe ainda uma série de medidas de ordem política que geraram grande polêmica, entre elas podemos citar a instituição do divórcio na França, a implantação de um novo sistema de ensino, tornando-o gratuito e proibindo formalmente o ensino religioso, propostas que geram acirrados debates, pois rompiam com arraigadas tradições do povo francês. Os famosos escritos de durkheimianos sobre a função social da Educação (referência bibliográfica ainda atual na Pedagogia) foram escritos como parte dos debates desse momento.
Ao mesmo tempo que essas questões políticas e morais tomavam conta do cenário social da França no final do século XIX, questões de natureza econômica repercutiram. A França de Durkheim vivia a bipolarização entre burguesia e proletariado, com a organização dos trabalhadores impulsionando greves e passeatas, preocupando não somente políticos mas também intelectuais da época. Na famosa obra da sociologia “A Divisão do Trabalho Social”, Durkheim nos mostra como a solidariedade, ao invés da produtividade, é a função do trabalho coletivo.
Portanto, ao lado das preocupações especificamente teóricas e metodológicas da elaboração da sociologia, havia o cidadão Durkheim e suas intenções de participar das questões de sua época fornecendo ferramentas intelectuais que pudessem levar as autoridades a intervirem de forma eficiente em uma realidade problemática e cheia de conflitos.

A primeira obra de Durkheim

Durante os anos em que ministrou aulas de Filosofia em várias escolas, Durkheim volta seu interesse para a Sociologia. Apesar de a França ser o berço da ciência social devido aos trabalhos de Comte, não havia nesse país o ensino regular dessa disciplina. Além desse fato, a Sociologia recebia influência cada vez mais forte das propostas socialistas e da política própria do movimento operário, já que o positivismo comteano perdia cada vez mais adeptos na França. Decidido a desfazer essa confusão de fundamentos, Durkheim trabalha para emancipar a Sociologia da Filosofia Social (seja ela comteana, marxista ou anarquista), com o objetivo de concebê-la como disciplina científica rigorosa passível de ensino nos colégios, faculdades e universidades.
Seu primeiro trabalho publicado (1893) foi o resultado de seu doutoramento: “A Divisão do Trabalho Social” ( De la division du travail social ). Nesse texto ( que alcançou grande repercussão no meio acadêmico e também fora dele) Durkheim estuda a interação social entre os indivíduos que integram uma coletividade, isto é, quais são as condições existência da sociedade. Trata-se de um tema central da sociologia pensamento sociológico de Durkheim, cujo principal interesse é desvelar os fatores que possibilitam a coesão (unidade, estabilidade) e a permanência (ou continuidade) das relações sociais ao longo do tempo e de gerações. Dentro dessa perspectiva sociológica , a existência de uma sociedade só é possível a partir de um determinado grau de consenso entre seus membros constituintes: os indivíduos. Segundo Durkheim, esse consenso se assenta em diferentes tipos de solidariedade social.

A solidariedade mecânica

Durkheim, como já dissemos, esclarece que a existência de uma sociedade, bem como a própria coesão social, está baseada num grau de consenso entre os indivíduos e que ele designa de solidariedade. De acordo com o autor, há dois tipos de solidariedade.
A solidariedade mecânica prevalece naquelas sociedades ditas "primitivas" ou "arcaicas", ou seja, em agrupamentos humanos de tipo tribal formado por clãs. Nestas sociedades, os indivíduos que a integram compartilham das mesmas noções e valores sociais tanto no que se refere às crenças religiosas como em relação aos interesses materiais necessários a subsistência do grupo, essa correspondência de valores assegura a coesão social. Nessa sociedade, os indivíduos se identificam através da família, da religião, da tradição, dos costumes. É tipo de sociedade que tem coerência porque os indivíduos ainda não se diferenciam e por isso a dinâmica da integração de seus membros está no reconhecimento dos mesmos valores, os mesmos sentimentos, os mesmos objetos sagrados, porque pertencem a uma coletividade. Portanto, é uma solidariedade baseada na semelhança entre os indivíduos.
Uma vez que a solidariedade varia segundo o grau de modernidade da sociedade, com o desenvolvimento da vida coletiva na história a base do consenso tornar-se jurídica, pois é preciso definir, numa sociedade moderna e mais complexa, regras de cooperação e troca de serviços entre os que participam do trabalho coletivo. A essa forma moderna de solidariedade Durkheim nomeia de solidariedade orgânica.

A solidariedade orgânica
De modo distinto, a solidariedade orgânica que é a do tipo que predomina nas sociedades ditas "modernas" ou "complexas" do ponto de vista da maior diferenciação individual e social (o conceito pode ser aplicado às sociedades capitalistas). Além de não compartilharem dos mesmos valores e crenças sociais, os interesses individuais são bastante distintos e a consciência de cada indivíduo é mais acentuada.
A divisão econômica do trabalho social é mais desenvolvida e complexa e se expressa nas diferentes profissões e variedade das atividades industriais.
Durkheim emprega alguns conceitos das ciências naturais, em particular da biologia (paradigma científico do conceito de vida, muito em uso na época em que ele começou seus estudos sociológicos), concebendo as sociedades complexas como grandes organismos vivos, onde os órgãos são diferentes entre si (que neste caso corresponde à divisão do trabalho), mas todos dependem um do outro para o bom funcionamento do ser vivo. A crescente divisão social do trabalho faz aumentar também o grau de interdependência entre os indivíduos. Para garantir a coesão social, portanto, onde predomina a solidariedade orgânica, a coesão social não está assentada em crenças e valores sociais, religiosos, na tradição ou nos costumes compartilhados, mas nos códigos e regras de conduta que estabelecem direitos e deveres e se expressam em normas jurídicas: isto é, o direito.
Vale lembrar do alerta que Durkheim nos faz a respeito da solidariedade típica das sociedades modernas. Com do aumento do individualismo, a coesão social poderia se enfraquecer e o excesso de individualismo (diferenciação) pode levar a anomia (ausência de coesão). Para se manter a coesão social (a vida da sociedade) Durkheim ressalta a importância do direito e de todo o sistema jurídico moderno. Portanto, apesar de defender, de certa forma, o pensamento liberal como forma última de evolução e, assim, justificar o individualismo racionalista típico das sociedades modernas e orgânicas, Durkheim prega o respeito por normas e valores coletivos previstos em Lei.

A Consciência coletiva e a Instituição Social
O conceito de consciência coletiva, fundamental para a sociologia durkheimiana, decorre dos estudos realizados sobre os tipos de solidariedade. Segundo Durkheim, o conjunto de crenças e de sentimentos comuns entre os membros de uma mesma sociedade que forma um sistema determinado, tendo uma existência própria, é denominado consciência coletiva ou comum. Essa consciência não tem como base um órgão único, seria difusa, ocupando toda a extensão da sociedade. Ela seria independente das condições particulares em que se situam os indivíduos, seria a mesma no Norte e no Sul, nas grandes e nas pequenas cidades, nas diferentes profissões. Portanto, não se confunde com as consciências particulares, embora se realize apenas nos indivíduos. Seria o tipo psíquico da sociedade, tipo que tem suas propriedades, condições de existência, seu modo de desenvolvimento, exatamente como os tipos individuais, embora de outra maneira, não mudando com o passar das gerações, mas ao contrário ligando as gerações que se sucedem. Nesse momento de sua elaboração teórica, Durkheim defende também o primado da sociedade sobre o indivíduo. Partindo deste raciocínio ele desenvolve um dos seus principais conceitos: o conceito de Instituição.

A Instituição social seria um mecanismo de proteção da sociedade, feita de um conjunto de regras e de procedimentos padronizados socialmente, reconhecidos, aceitos e sancionados pela sociedade, cuja importância seria o de manter a organização do grupo e satisfazer as necessidades dos indivíduos que dele participam. As instituições seriam, portanto conservadoras por essência, quer seja ela a família, a escola, o governo, a polícia ou qualquer outra, agem fazendo força contra as mudanças, pela manutenção da ordem.
Durkheim deixa bem claro em sua sociologia o quanto acredita que essas instituições são valorosas e parte em sua defesa, o que o deixou com uma certa reputação de conservador, que durante muitos anos causou antipatia a sua obra. Mas Durkheim não pode ser meramente tachado de conservador, sua defesa das instituições se baseia num ponto fundamental: o ser humano necessita se sentir seguro, protegido e respaldado. Uma sociedade sem regras claras, sem valores, sem limites leva o ser humano ao desespero.
A Anomia Social
Não é coincidência que Durkheim tenha se preocupado com a condição do individuo no interior da sociedade justamente em um momento em que as instituições sociais se encontravam enfraquecidas na Europa. Durante o final do século XIX, muito dos valores tradicionais foram rompidos e novos surgiam, havia muita gente vivendo em condições miseráveis, desempregadas, doentes e marginalizadas. Esses problemas observados foram considerados como uma espécie de patologia do organismo social levando Durkheim a desenvolver o conceito de Anomia.
Na tentativa de “curar” a sociedade da anomia, Durkheim descreve a necessidade de se estabelecer nela uma organicidade. Seguindo o exemplo de um organismo biológico, onde cada órgão tem uma função e depende dos outros para sobreviver, cada membro da sociedade deveria se manter coeso a um meio moral (sentindo-se parte de um todo) e solidário aos outros, exercendo uma clara e importante função na divisão do trabalho. A essa função o indivíduo seria obrigado através de um sistema de direitos e deveres. Portanto, a anomia seria algo que devia ser vencido e a sociologia seria o meio para isso. Ao sociólogo caberia estudar, entender e ajudar a sociedade a alcançar o seu estado de “saúde”, defendendo as Instituições sociais para que os indivíduos interiorizassem o fato deles necessitarem da sociedade de forma orgânica.
Desses estudos decorre uma das mais importantes posturas teórico-metodológicas da sociologia de Durkheim: os fenômenos individuais devem ser explicados a partir da coletividade, e não a coletividade pelos fenômenos individuais. Donde a divisão do trabalho ser um fenômeno social que só pode ser explicado por outro fenômeno social, como a combinação do volume, densidade material e moral de uma sociedade, sendo que o único grupo social que pode proporcionar a integração dos indivíduos na coletividade é a corporação profissional.
O Fato Social e o método da Sociologia
Após apresentar a sua sociologia ao mundo com a publicação de seus primeiros conceitos, Durkheim se dedica à tarefa de elaborar as bases metodológicas dessa ciência, para que a mesma se tornasse uma disciplina rigorosamente científica e ministrável nos colégios, faculdades e universidades francesas.
Em sua nova empreitada, Durkheim identificou o objeto específico e definiu o método e as aplicações desta nova ciência. Nesse contexto, formulou com clareza o tipo de acontecimento sobre o qual o sociólogo deveria se debruçar, denominando-o de fato social e que deveria ser o objeto da Sociologia. Portanto, para que haja tal ciência seriam necessárias duas coisas: um objeto específico que se distinga dos objetos das outras ciências e um objeto que possa ser observado e explicado, como se faz nas ciências. Em 1895, Durkheim publica o estudo denominado "As Regras do Método Sociológico", onde define o objeto por excelência da sociologia: os fatos sociais.
Como já mencionamos, para Durkheim a sociedade prevalece sobre o indivíduo. Essa sociedade seria um conjunto de normas de ação, pensamento e sentimento que não existem apenas na consciência dos indivíduos, mas que são construídas exteriormente, isto é, fora das consciências individuais. Na vida em sociedade, o homem se defronta com regras de conduta que não foram diretamente criadas por ele, mas existem e são aceitas em sociedade, devendo ser erguidas por todos. Sem regras a sociedade não existiria, por isso os indivíduos devem obedecê-las. Em toda sociedade, existem leis que organizam a vida em conjunto e os indivíduo reformulando-as coletivamente. Essas leis são transmitidas para as gerações seguintes na forma de códigos, decretos, constituição, etc. Durkheim afirma que os fatos sociais, o objeto de estudo da sociologia, são justamente essas regras e normas coletivas que orientam a vida dos indivíduos. Ele chama de reino social o lugar em que esses fatos se desenvolvem. Portanto, Durkheim defende a idéia de que em toda sociedade há um certo número de maneiras de pensar, de sentir e de agir que por suas características observadas não podem ser considerados frutos da psicologia individual mas sim do meio social, da coletividade, ou seja, da sociedade. Na obra “As Regras do Método Sociológico”, Durkheim resume todas essas idéias definindo o fato social (o objeto de estudo da Sociologia) como toda forma de pensar, sentir e agir que é coletiva, exterior e coercitiva ao individuo.
Para esclarecer o significado do Fato Social, vamos apresentar cada uma de suas características identificadoras.

1) coercitividade: a força que exercem sobre os indivíduos obrigando-os através do constrangimento a se conformarem com as regras, normas e valores sociais vigentes;
2) exterioridade: um fenômeno social que atua sobre os indivíduos, mas independe das vontades individuais;
3) generalidade: a manifestação de um fenômeno que permeia toda a sociedade, isto é, que atua sobre a grande maioria dos indivíduos de um grupo social determinado.

O que Durkheim quer nos dizer também com essa definição é que o fatos social, além de ser um produto exclusivamente coletivo, possui uma realidade objetiva e que, portanto, é passível de observação externa do sociólogo. Deve, desta forma, ser tratado metodologicamente como "coisa". Essa postura científica é o fundamento de todo o método durkheimiano exposto nas “Regras do Método Sociológico”. Não podem ser confundidos com os fenômenos orgânicos nem com os psíquicos, constituem uma espécie nova de fatos. O pesquisador deve isolar o fenômeno estudado de idéias individuais impostas ou pressupostas, analisando particularmente o fenômeno na forma em que se encontra, orientando-se pela natureza das coisas e não pelo “senso comum”.
Dizer que os Fatos Sociais devem ser estudados e explicados como coisas, quer dizer que os fenômenos sociais seriam exteriores aos indivíduos, inclusive ao cientista que o estuda. Sendo coisas, os fenômenos sociais deveriam ser conhecidos não pelo método psicológico, pela busca das razões internas aos indivíduos, mas sim externamente a ele na própria sociedade e na interação dos fatos sociais. Aquelas formas de ser (de pensar, sentir e agir) que pensamos ser produto de nossa intimidade e individualidade, isto é, de nossa natureza humana, seriam coletivas e introjetadas em nós de fora pela ação da sociedade.
O suicídio, por exemplo, que a primeira vista pode ser encarado como um fenômeno individual, é um fato social para Durkheim. A constatação da regularidade de suicídios na França ao longo do tempo (de acordo com os dados estatísticos), o estudo de sua forma de atuação e disseminação em um determinado grupo social (a sociedade francesa do final do século XIX) fez com que Durkheim o concebesse como um fenômeno social, propriamente um fato social, que é explicado pelo autor como um fato próprio da crise moral da sociedade, isto é, de funções e disfunções da consciência coletiva e não como a simples soma de estados psicológicos individuais de uma população.
Vale lembrar que para Durkheim, a sociedade não seria simplesmente a realização da natureza humana, mas, ao contrário, aquilo que é considerado natureza humana seria, na verdade, produto da própria sociedade. Não seria a simples soma de seus indivíduos componentes, mas um ser novo com uma existência própria e independente de seus membros. Nesse caso, tratar os Fatos Sociais como “coisas” seria respeitar a dinâmica própria da realidade social e de seus fenômenos. Na obra “O Suicídio”, uma brilhante obra de análise sociológica aplicada, Durkheim seguiu rigorosamente o método elaborado para a sua sociologia e chegou a resultados surpreendentes para época mudando definitivamente a visão das pessoas a respeito do fenômeno da morte voluntária.
A sociologia, a filosofia e a educação.
Um último aspecto da sociologia durkheimiana, sempre mencionado por seu autor, é a contraposição dela ao conhecimento filosófico da sociedade. Segundo Durkheim, a filosofia parte da tentativa de explicar a sociedade a partir do conhecimento da natureza humana. Ou seja, para os filósofos o conhecimento da sociedade pode ser feito a partir de dentro, do conhecimento da natureza do indivíduo. Durkheim inverte a visão filosófica de que a sociedade é a realização de consciências individuais. Para ele, as consciências individuais são formadas pela sociedade por meio daquilo que Durkheim denominou de processo de socialização. Nessa concepção, as consciências individuais são formadas pela sociedade. Em oposição ao idealismo filosófico, de acordo com o qual a sociedade é moldada pelo "espírito" ou pela consciência humana, Nas palavras de Durkheim, "a construção do ser social, feita em boa parte pela educação, é a assimilação pelo indivíduo de uma série de normas e princípios — sejam morais, religiosos, éticos ou de comportamento — que balizam a conduta do indivíduo num grupo. O homem, mais do que formador da sociedade, é um produto dela". Essa teoria, além de caracterizar a educação como um bem social, diminuiu o valor que as capacidades individuais teriam na constituição e no desenvolvimento da vida coletiva.

Atenção ao conceito de Coerção Social
Segundo Durkheim, a coerção social seria a força que os fatos sociais exercem sobre os indivíduos, obrigando-os a conformarem-se às regras impostas pela sociedade em que vivem, não havendo a escolha dos indivíduos. Tal força manifesta-se quando o indivíduo adota um determinado idioma, quando aceita determinado tipo de formação familiar ou quando está subordinado a determinado código de leis. A coerção é constatada pelas sanções que serão impostas ao indivíduo, caso ele venha a se rebelar. Essas sanções, em princípio, são espontâneas, para desvios leves, provenientes de uma conduta não adaptada à estrutura do grupo ou da sociedade à qual o indivíduo pertence. Desvios considerados graves sofrem coerção através da punição (peso das leis). Essas regras são transmitidas através da educação, seja ela formal ou informal. Na nossa cultura, o uso de vestimentas é algo que vem sendo transmitido de gerações para gerações, fazendo com que o indivíduo tenha essa prática naturalmente. Aquele que por alguma razão não o fizer, estará sujeito a ser excluído ou discriminado dentro do seu grupo, por não enquadrar-se aos padrões que a própria sociedade determinou.

A objetividade do método sociológico.
Durkheim procurou definir o método científico de conhecimento para a sociologia. Para ele, toda explicação científica exigiria que o pesquisador mantivesse uma certa distância e tivesse neutralidade em relação aos fatos, pois valores e sentimentos pessoais do pesquisador poderiam distorcer a realidade dos fatos observados. Portanto, o sociólogo deverá manter-se neutro ante ao fato observado.Com essa visão, Durkheim pretendia garantir à sociologia o sucesso das ciências exatas e biológicas, bem como a definição de seus conceitos como científicos, acabando de vez com os "achismos" ( o senso comum ), que interpretavam de maneira distorcida a realidade social. Deveríamos nos despir de todos os nossos preconceitos nossas idéias a priori quando fôssemos nos debruçar sobre os fenômenos sociais. Por fim, para identificar um fato social seria necessário que o cientista soubesse separar aqueles que apresentam características exteriores comuns, dentre os acontecimentos gerais e repetitivos. Todos esses procedimentos metodológicos são explicados na obra “As Regras do Método Sociológico”.

A normalidade e a classificação sociais
Em suas análises da consciência coletiva, Durkheim cria um novo campo de análise, chamado de morfologia social, sendo a classificação das espécies sociais numa clara referência às espécies estudadas em biologia. Partindo dessa classificação, um fenômeno social só poderia ser considerado imoral, reprovável, criminoso ou até mesmo anômico, dentro do contexto do nível de desenvolvimento e do tipo organização social estudada. Portanto, a definição do normal e do patológico seria dependente das observações e análises objetivas dos tipos específicos de sociedade e de seus níveis de desenvolvimento moral e institucional, ou seja, em função do estágio social da sociedade em questão. Para Durkheim,todas as sociedades tinham sua evolução a partir da horda, a forma social mais simples, igualitária, reduzida a um único segmento onde os indivíduos estariam justapostos e iguais. Através desse estudo, Durkheim identificou outras espécies sociais, encontrando-as no passado e no presente. Não podemos esquecer que essa classificação das sociedades deveria ter sempre como base a observação experimental, contrariando posturas filosóficas de sua época, como o positivismo comteano. São palavras de “Durkhiem: “Um fato social não pode, pois, ser acoimado de normal para uma espécie social determinada senão em relação com uma fase, igualmente determinada, de seu desenvolvimento” E ainda: "... do ponto de vista puramente biológico, o que é normal para o selvagem não o é sempre para o civilizado, e vice-versa."
Conheça a história da Comuna de Paris
A Comuna de Paris foi o primeiro governo operário da história, fundado em 1871 na capital francesa por ocasião da resistência popular ante à invasão alemã. A história moderna registra algumas experiências de regimes comunais, impostos como afirmação revolucionária da autonomia da cidade. A mais importante delas - a Comuna de Paris - veio no bojo da insurreição popular de 18 de março de 1871. Durante a guerra franco-prussiana, as províncias francesas elegeram para a Assembléia Nacional uma maioria de deputados monarquistas francamente favorável à capitulação ante a Prússia. A população de Paris, no entanto, opunha-se a essa política. Thiers, elevado à chefia do Gabinete conservador, tentou esmagar os insurretos. Estes, porém, com o apoio da Guarda Nacional, derrotaram as forças legalistas, obrigando os membros do governo a abandonar precipitadamente a capital francesa, onde o comitê central da Guarda Nacional passou a exercer sua autoridade. A Comuna de Paris - considerada a primeira República Proletária da história - adotou uma política de caráter socialista, baseada nos princípios da Primeira Internacional. O poder comunal manteve-se durante cerca de 40 dias. Seu esmagamento revestiu-se de extrema crueldade. De acordo com a Barsa mais de 20.000 communards foram executados pelas forças de Thiers. O governo durou oficialmente de 26 de março a 28 de maio, enfrentando não só o invasor alemão como também tropas francesas, pois a Comuna era um movimento de revolta ante o armistício assinado pelo governo nacional (transferido para Versalhes) após a derrota na Guerra Franco-Prussiana. Os alemães tiveram ainda que libertar militares franceses feitos prisioneiros de guerra, para auxiliar na tomada de Paris.

Os tipos de Suicídio como fatos sociais
Segundo Durlheim, são três os tipos de suicídio identificados sociologicamente: o egoísta, o altruísta e o anômico. O Suicídio egoísta seria um ato individualista extremado. É o tipo de suicídio que predomina nas sociedades modernas e é geralmente praticado por aqueles indivíduos que não estão devidamente integrados à sociedade e geralmente se encontram isolados dos grupos sociais (família, amigos, comunidade, por exemplo). Esse tipo de ato suicida seria resultado da divisão do trabalho social típica das sociedades modernas. O suicídio altruísta, por sua vez, seria um ato em que o indivíduo estaria tomado pela obediência e força coercitiva do coletivo, seja ele um grupo social restrito ao qual pertence ou mesmo a sociedade como um todo. Um exemplo típico de suicídio altruísta é o caso dos soldados japoneses que lutaram na Segunda Guerra Mundial e que ficaram conhecidos como camicases. Ao lançarem as aeronaves em que pilotavam sobre os inimigos provocando sua própria morte, os camicases japoneses morriam em honra ao imperador, considerado por eles uma divindade. A variante contemporânea do suicídio altruísta são os atos terroristas praticados por fanáticos religiosos e extremistas políticos. Por fim, o suicídio anômico,representado mais propriamente uma mudança abrupta na taxa normal de suicídio, seria marcado por uma vertiginosa ascensão do número de suicídios que ocorrem em períodos de crises sociais (o desemprego, por exemplo) ou processos de transformações sociais (como a modernização).

PARA ENTENDER ASPECTOS DE MARX



DIALÉTICA: método e visão de mundo.

A dialética concebe tudo em movimento; afirmar segundo tal concepção que algo é significa, que este mesmo algo está em determinado momento, dessa ou daquela forma, de acordo com certo estágio de desenvolvimento – momento processual – ainda não plenamente realizado. Exemplo: um professor não “nasce” professor, torna-se professor, ou, ninguém nasce mulher ou homem, torna-se mulher ou homem. A flor não é só flor, mas todo o processo desde a semente até sua morte. Para a dialética, as coisas não são, elas vem a ser. Nesse caso, somos conforme as circunstâncias e ao mesmo tempo nossas próprias escolhas. Se quisermos entender o ser humano, devemos estudá-lo ao longo de sua vida, perceber o contexto de suas escolhas, acompanhá-lo nos diferentes processos a caracterizar o seu dia-a-dia. Seu “eu” e seu lugar no mundo.
A Dialética é uma visão de mundo e também um método de interpretar a realidade. Quais seriam as características essenciais de tal visão de mundo?

a) A TESE: a idéia de mútua determinação entre as partes componentes do real (a idéia de totalidade)
b) A ANTÍTESE: a idéia de que tudo o que existe é contraditório – a contradição existindo como razão de ser de tudo que existe (o “motor” da vida)
c) A SÍNTESE: a idéia de negação da negação, ou seja, a realidade se coloca como necessidade de mudança constante.

A contradição constitui a essência do existir. Segundo certa concepção da realidade (lógica formal), ser e não ser ao mesmo tempo não seria possível. Entretanto, para a Dialética algo é e não é ao mesmo tempo e tudo está sendo assim ou assado. Para Aristóteles, os escravos eram escravos; para um dialético os escravos estavam (na condição de) escravos, pois havia também senhores, isto é, só haveria o homem que nada tem (o escravo) se houvesse o homem que tudo tem (o senhor). Nesse caso, o escravo seria tudo o que o senhor não é e vice-versa: o senhor seria tudo o que o escravo não é.

O ESTUDO DIALÉTICO DO HUMANO: a produção da vida.

Vida é atividade. Vivemos a depender do quanto somos ativos. Se a intenção é entender o homem, deve-se reproduzir teoricamente a maneira ou as formas de atuação dele. Em cada momento da vida humana, ou em cada período histórico, os homens tiveram que se organizar de um determinado modo para produzir condições para sua sobrevivência. O homem é o que produz e também a forma como produz.
O homem é, dependendo do que e de como faz. Não só transforma, de uma forma específica a natureza ao seu redor, mas também se transforma, arrancando de si novas qualidades e potências quando age dessa maneira. Quando trabalhamos (historicamente), buscamos retirar da natureza certos materiais para que sejam transformados e passem a atender as nossas necessidades humanas. Corto uma árvore e transformo-a em madeira, tábua, matéria prima. Faço uma mesa. Ao fazer isso (ao trabalhar) o homem está na verdade dominando a natureza (a própria e a externa) e ao mesmo tempo conhecendo suas “leis” internas; “arranca” de si mesmo nesse processo novas qualidades, desenvolve novas potencialidades; adapta os materiais da natureza às suas necessidades.
O homem, vivendo (trabalhando), não apenas desenvolve novas técnicas e conhecimentos, mas também vai aos poucos modificando as condições nas quais ele existe; produzindo novas maneiras de pensar, sentir, fabular, ou dito em uma só palavra, de viver. Vida é atividade.

O TRABALHO HUMANO: os Modos de Produção.

Tendo de sobreviver o homem precisou ao longo do tempo conhecer, conquistar e dominar a natureza (a própria e a natural). Cada grupo humano num certo momento da história teve que se organizar de determinado modo, para atender as próprias demandas e/ou necessidades. Nesse caso, como entender a história? Marx procura compreender e interpretar as diferentes formas de vida coletiva ao longo do tempo. Percebeu certos estágios de desenvolvimento no que se refere à capacidade do homem para produção e transformação da natureza (tanto interna, de si mesmo, quanto externa). A esses estágios ou momentos do desenvolvimento humano denominou modos de produção.
Modo de produção pode ser definido como um determinado conjunto de estratégias produtivas e organizatórias, de conhecimentos, relações socais e/ou ações dirigidas, objetivando transformar a natureza e garantir desta forma, as condições indispensáveis ao existir humano em um determinado espaço e momento históricos.
Para Marx, um determinado modo de produção possui dois elementos básicos:
a) forças produtivas (por exemplo: união de um indivíduo com um determinado tipo de instrumento de trabalho 0 o homem e uma enxada, um homem e um trator);
b) relações de produção (por exemplo: a relação de um escravo com seu dono, de um servo com seu senhor ou de um assalariado com seu patrão).

Basicamente existiriam quatro modos de produção:
a) o modo de produção asiático (Egito, Mesopotâmia, China e Índia da Antiguidade);
b) o modo de produção escravista (Grécia e Roma);
c) o modo de produção feudal (responsável pela formação da cultura ocidental moderna);
d) o modo de produção capitalista ( dominante na época de Marx e em decisivo processo de expansão em todo o mundo).

A REVOLUÇÃO: o desenvolvimento dos Modos de Produção.

A passagem de um modo de produção para outro só ocorrerá quando o desenvolvimento das contradições e potencialidades desse mesmo modo de produção atingirem alguma maturidade. Isso somente acontece a partir do momento em que as relações sociais entravam, impedem ou dificultam o desenvolvimento das forças produtivas. A passagem de um modo de produção para outro tanto pode significar progresso (como por exemplo, no caso do feudalismo para o capitalismo) ou retrocesso (como por exemplo, no modo de produção escravista para o modo de produção feudal) no que se refere ao desenvolvimento das forças produtivas e capacidades humanas. A passagem do modo de produção capitalista para o modo de produção socialista não poderá ocorrer de forma espontânea (tal qual se deu no passado com outros tipos de modo de produção). Só o proletariado organizado e consciente de sua tarefa ou “missão” histórica poderá realizar tal transição.